A partir da primeira metade do século XX, sobretudo com o advento da escola dogmático-alemã de direito penal, houve uma profunda e paulatina modificação na atuação profissional dos criminalistas, reflexo da separação de saberes ocorrida na formação acadêmica, vez que, cada vez mais as disciplinas foram estudadas de forma absolutamente autônomas: majoritariamente, abandonaram-se as acusações e defesas “de fundo” que as formações humanísticas dos antigos profissionais propiciavam, passando-se a privilegiarem-se as acusações e defesas “de forma” (discussão de nulidades processuais, etc.). Assim, os profissionais foram se pautando por um desumanizado e improdutivo tecnicismo, refletindo acusação-defesa um mesmo e pálido modelo mecanicista de agir.

Atingido o apogeu do formalismo jurídico, como se o direito fosse ciência exata, hipertrofie no pesquisador científico e no operador do direito um saber-nada-mais-que-jurídico muitas vezes estéril ou limitador. Perdeu espaço a acusação “de fundo”, a defesa “de fundo”, reservadas estas somente a uns poucos, mas, grandes pro¬fissionais. O fenômeno, hoje, é mundial. Promotores, juízes e advogados distanciaram-se das ciências a quentes ou contributivas do direito penal (filosofia do direito, psicologia judiciária penal, criminologia, vitimologia, criminalística, sociologia criminal, estatística criminal, psiquiatria forense, antropologia criminal, perícia criminal, etc), limitando-se a visão do “case” penal, cuja discussão restou empobrecida, reduzida a uma simples e superficial análise das provas ou nulidades.

A prova perdeu seu conhecimento, sua interpretação, sendo homologada ou sopesada ao sabor de modismos, formais tendências jurisprudenciais, ideologia, conveniências, perdendo o caráter de fonte produtora da verdade, porque esquecida a ciência da “interpretação psicológica das provas”. Institutos jurídicos da mais alta importância restaram desprezados, ou relegados à dissecção teórica na academia, matérias contributivas das ciências penais completamente olvidadas, reduzindo-se assim verídicas possibilidades de defesa e acusação, abandonando-se no processo a busca da verdade real, quase o transformando no contentamento de uma “verdade formal”.

A linguagem processual empobreceu como signo de realidades esquecidas, tal como ocorreu com o depauperamento da própria linguagem falada e escrita na atualidade. Reduzida a forma a modelos ¨standards¨ de estudo e atuação profissional, a pesquisa e a prática passaram a ser automatizadas para os homens a que se propunham, não se atentando para as individualidades dos profissionais e clientes, muitas vezes fazendo da acusação ou defesa verdadeiras “commodities” jurídicas: todos atuam de forma aproximadamente igual. Equalizou-se, assim, a mesmice na atuação forense. Conseqüência inegável, é que os atores do processo penal vêm perdendo paulatinamente suas identidades: juiz, promotor e advogado reproduzindo discursos análogos, dissolvendo-se a característica individualidade de funções distintas no pensamento coletivo, matematizando-se o direito e suprimindo-se a adequada exploração da potencialidade de seus operadores, perdendo o “case” o encantamento, a verdade seu objeto e, fazendo de defesas, acusações e julgamentos a singela reprodução de um pensar pobre, mas, simétrico.